Queda atinge 16 dos 22 segmentos industriais e reflete impacto dos juros altos, aumento das importações e incertezas no cenário global
A indústria de transformação brasileira registrou uma queda de 5,3% no faturamento real em agosto, em comparação com julho, segundo dados divulgados nesta terça-feira (7) pela Confederação Nacional da Indústria (CNI). O resultado reforça o quadro de desaceleração do setor, que acumula quatro retrações em seis meses.
Em julho, o índice havia apresentado leve estabilidade, com crescimento de apenas 0,4%. Com o desempenho negativo de agosto, o avanço acumulado do setor no ano caiu de 5,1% para 2,9% em relação ao mesmo período de 2024, indicando perda de ritmo nas atividades industriais.
Queda atinge maioria dos setores e reflete pressão dos juros
Segundo a especialista em Políticas e Indústria da CNI, Larissa Nocko, a retração foi observada em 16 dos 22 segmentos analisados, com destaque para biocombustíveis e alimentos, dois dos setores com maior peso na economia.
Para ela, o resultado é reflexo direto do elevado patamar dos juros, que encarece o crédito e freia o consumo e os investimentos produtivos.
“Esse comportamento mais fraco da indústria de transformação também está associado à entrada significativa de bens importados, especialmente de consumo final, o que acaba capturando parte do mercado interno da indústria nacional”, explicou Nocko.
Cenário internacional e câmbio agravam situação
A especialista também apontou fatores externos que contribuíram para a retração. A valorização do real e as novas políticas comerciais dos Estados Unidos vêm reduzindo a competitividade dos produtos brasileiros no exterior.
“Com o real mais valorizado, nossos produtos ficam mais caros lá fora, e as indústrias exportadoras perdem espaço. Além disso, o aumento das incertezas globais e a desaceleração da economia mundial afetam negativamente o comércio internacional”, avaliou Nocko.
Importância do setor para o crescimento econômico
Para o professor Victor Gomes, do Departamento de Economia da Universidade de Brasília (UnB), o desempenho industrial tem efeito direto sobre o dinamismo econômico do país.
“A indústria é o setor que gera valor agregado, salários mais altos e lucros distribuídos ao longo da cadeia produtiva. Quando a indústria perde força, todo o sistema econômico sente o impacto”, afirmou.
Gomes destacou ainda a importância de parcerias comerciais estratégicas para reverter o quadro.
“O Brasil depende de acordos com grandes mercados, especialmente os Estados Unidos. A aproximação com esses parceiros pode estimular a produção industrial e abrir novas oportunidades de exportação”, defendeu.
Emprego e produção mantêm estabilidade
O número de horas trabalhadas na produção caiu 0,3% em agosto, mas ainda mostra alta de 1,6% no acumulado do ano. O emprego industrial manteve-se estável pelo quarto mês consecutivo, após 18 meses de crescimento ininterrupto encerrados em abril.
No balanço de janeiro a agosto, o setor empregava 2,2% mais trabalhadores do que no mesmo período de 2024, demonstrando resiliência no mercado de trabalho, mesmo com a retração na produção.
Salários e renda seguem em queda
A massa salarial do setor industrial caiu 0,5% de julho para agosto, acumulando retração de 2% no ano. O rendimento médio dos trabalhadores também apresentou queda de 0,6% no mês e 4,1% em relação a 2024, refletindo a perda de dinamismo econômico.
Por outro lado, a utilização da capacidade instalada (UCI) apresentou leve melhora, subindo 0,2 ponto percentual, e atingindo 78,7%. Ainda assim, o índice permanece 0,7 ponto abaixo da média registrada no mesmo período do ano passado, segundo a CNI.
Com os resultados de agosto, a indústria de transformação reforça os sinais de desaceleração e pressão estrutural, diante de custos financeiros elevados, concorrência externa crescente e cenário global adverso. Especialistas apontam que uma política industrial robusta e estímulos à produtividade serão essenciais para retomar o ritmo de crescimento nos próximos meses.
Fonte: Brasil 61 / Confederação Nacional da Indústria (CNI)